quarta-feira, janeiro 13, 2010

sábado, janeiro 02, 2010

Os Obituários da Década

Quando se chega ao fim do ano, todos os jornais, revistas, blogs (ou outros espaços onde os opinion makers dão a sua palavra), publicam as suas listas dos melhores: os melhores livros do ano, os melhores discos do ano, os melhores espectáculos do ano, as melhores fotografias do ano, os melhores artigos do ano, as melhores frases do ano, os melhores jogos do ano, os melhores posts do ano…


Com o final de 2009, juntou-se outra lista: os melhores da década – o melhor disco da década, o melhor livro da década, os maiores acontecimentos sociais da década, as palavras mais influentes da década…


Por sua vez, em final de ano, e de década, chega sempre o momento de anunciar o nome dos maiores vultos que “nos abandonaram”, isto é, que faleceram, ou que deixaram este cruel vale de lágrimas.
Neste início de 2010, o Ângulo dá o seu humilde contributo para algumas destas questões. Comecemos pelo obituário. Não vou falar do obituário da personalidade do ano, ou da década, nem sequer da semana. Mas não interessa. É a personalidade deste artigo. Trata-se do guitarrista Rowland S. Howard.


Quem?


Rowland S. Howard, um sujeito australiano, que adormeceu para o seu sono eterno no passado dia 30 de Dezembro, vítima de doença prolongada.


Quando Howard bateu as botas, tinha acabado de lançar um disco a solo, chamado “Pop Crimes”. Segundo a Imprensa especializada australiana, trata-se de um dos melhores discos do ano, lançado na terra dos coalas e dos cangurus.


E cá está – o Ângulo divulga, neste momento, um dos melhores discos do ano. Pelo menos, na categoria de discos de Rock, lançados em território australiano.


Passemos à categoria de músicos da década e/ou músicos mais influentes:
Ora bem, Rowland S. Howard fez parte (juntamente com Nick Cave) dos Birthday Party que, para mim (e para outra pequena minoria, donde desconfio fazer parte, igualmente, o caro Boécio, escriba intermitente deste blog), lançaram um dos melhores discos rock de sempre: Junkyard (de 1982).


Howard era um dos compositores de serviço desta banda, e fez, igualmente, parte dos Crime and The City Solution (quem?), These Immortal Souls (santinho), tendo, também, lançado um belo disco a solo – Teenage Snuff Film, em 2000 (podiam mencionar o nome de alguma coisa de que tenhamos ouvido falar?).


Mais importante do que tudo isto, Rowland Howard influenciou muito o autor deste post. Quando este escriba começou a tocar guitarra, copiava, descaradamente, o estilo do Mestre australiano – na forma como mexia o cabelo, ou começava a bambolear pelo palco, em movimentos circulares.


No fundo, tudo o que sou hoje, quando ando por aí, a olhar para o chão, ou com um ar esgazeado, devo-o a Rowland S. Howard, o homem que vestiu o paletó de madeira no passado dia 30 de Dezembro. Os meus sinceros agradecimentos.


A nível musical, nunca lhe cheguei aos pés. Afinal, Rowland S. Howard é um dos guitarristas do ano, da década, dos últimos 25 anos, e dos últimos 35 anos (até me arrisco a dizer que é um dos melhores guitarristas dos últimos 37 anos e meio).
Vou meter dois pequenos vídeos de homenagem. No primeiro, vemos Howard, nos tempos dos Birthday Party, em Estúdio, a criar o tema “Jennifer’s Veil”.


No segundo vídeo, assistimos a um excerto do filme de Wim Wenders que em português deu pelo nome de “Asas do Desejo”. Quem viu esta película deve saber que se trata de um dos melhores filmes dos últimos 30 anos. Lá pelo meio, aparecem os Crime And The City Solution, a tocarem o tema “Six Bells Chime” (composto por Rowland S. Howard).


Matt Bellamy, o miserável guitarrista dos hediondos Muse (uma das piores doenças prolongadas deste início de milénio), foi considerado pela Revista Total Guitar, o guitarrista da década.
Em “Asas do Desejo”, os anjos (que conseguem ler os pensamentos das pessoas), não tentam saber o que pensa Rowland S. Howard. Mas ele, certamente, enquanto mexe o cabelo, e bamboleia pelo palco, saberá que Matt Bellamy, guitarrista da década, nunca teria lugar naquele filme. Quando muito, aparecerá num qualquer Avatar de futuro, a tocar a sua guitarra estridente, e virtuosa, em cima de algum pássaro virtual, apenas visível com óculos para 3D, numa sala de cinema cheia de pipocas.