sexta-feira, junho 30, 2006

"Que força é essa...."

Na minha agenda, apenas um compromisso: "falar com J.Calhau".
Mais nada, os dias do ano, imaculados, os feriados, sem nada a acrescentar,
nem uma data de aniversário ou outra lembrança.
Apenas este nome e um rosto que desconheço.
Mas não lhe ligo. Limito-me a ficar, estendido, expectante, fazendo de vez em quando uns rabiscos com o lápis, para me entreter.
O ano aproxima-se do fim. Volto a olhar para a agenda, pela milésima vez. Lá aparece, de novo, o nome, uma ameaça velada, uma promessa por cumprir.
Mais uma vez pego no telefone, disco o número, mas desligo quase de seguida.
Todos os dias, o mesmo ritual.
Acabada a semana, passam-se mais outros dois dias.
Às Segundas Feiras acordo mais cedo do que o habitual, revigorado, visto-me, como sempre, com a melhor roupa, barbeio-me, trauteio uma canção que ouvi no rádio a pilhas.
Na agenda, um compromisso: "falar com J.Calhau".

quinta-feira, junho 29, 2006

Alguns Apontamentos Sobre Música (com o nosso colaborador João Bonifárcio)

Resolvi fazer uma pausa nas minhas audições dos discos do Bonga e do novo do Scott Walker para me debruçar um pouco sobre a nossa banda portuense favorita, os GNR. Como se sabe, saiu uma antologia nova, para comemorar os 25 anos de carreira do grupo, "ContinuAcção" de seu nome, e que sucede a mais duas antologias, "Tudo o que você queria ouvir" (1996) e "Câmara Lenta" (2001). É um disco duplo, com 33 temas no total, vendido a preço de amigo! Apenas 17 euros e tal!As Editoras Discográficas andam generosas! Como nenhuma das compilações repete qualquer tema, as músicas mais conhecidas já ficaram para trás, nas outras antologias. Esta é para os fãs, os indefectíveis. Surgem 8 canções que nunca apareceram em CD e que são os verdadeiros motivos para a aquisição desta antologia.
Tudo isto é muito bonito, mas adensa-se cada vez mais um dos grandes mistérios da história da música pop/rock portuguesa: por que é que "Independança" (1982) e "Defeitos Especiais" (1984) nunca foram editados em CD?
Surgiram várias lendas urbanas sobre o assunto, até se disse que as gravações originais tinham sido destruídas no incêndio do Chiado.
Por alturas da compilação de 1996 comentou-se que as músicas dos discos que tinham sido para aí recuperadas provinham das gravações multipistas existentes, que se encontravam deterioradas e quase irrecuperáveis.
Disse-se também que a partir dessa altura só se poderiam fazer reedições a partir das bobines de produção (no máximo, seria feita uma remasterização, limitada em termos de resultados).
No meio de tantas conversas técnicas, restam-nos estes resultados práticos: neste momento, nas 3 compilações existentes, já saíram 5 canções de "Independança" (restam 3- o tema título, "The Light" e o épico "Avarias") e 6 de "Defeitos Especiais" (restam 3- "Absurdina", "A Última Vaga" e "Muçulmania").
Assim, deixa de fazer sentido esta explicação. Existe apenas um motivo pelo qual ainda não saíram estes álbuns em CD: o motivo económico. Estes só serão lançados, provavelmente, depois de uma quarta compilação dos GNR, daqui a uns 10 anos, que terá como inéditos os temas ainda não saídos em CD.
Os fãs não se importam de gastar 17 euros por meia dúzia de músicas inéditas. E depois, quando forem reeditados os álbuns, irão comprá-los, mesmo já tendo todas as canções.
Esta "maldição" dos GNR não se fica apenas pelos discos do grupo. Existem vários LP's de vários dos seus elementos que constituem uma raridade nos dias de hoje: de Rui Reininho, temos o álbum da Anar Band (1977); de Alexandre Soares temos o seu álbum a solo (Um Projecto Global-1988); de Vitor Rua temos os seus discos "polémicos"- o álbum "Pipocas", dos PSP (1988) e "Mimi tão pequena e tão suja" (1991), dos Pós-GNR.
O problema não se limita, contudo, apenas aos GNR: há vários discos portugueses, considerados importantes pela crítica, que nunca viram a edição em CD: só para dizer alguns nomes, "Música Moderna" (1979), dos Corpo Diplomático (de Pedro Ayres Magalhães); "Trauma" (1982), dos Street Kids (de Nuno Rebelo); "The Life os He" (1985), dos Croix-Sainte; "Muito Obrigado" (1988), dos Ocaso Épico, o álbum homónimo dos Linha Geral (1989), etc...
Outros saíram em CD, mas estão fora de circulação: dos Mão Morta, temos o clássico "Mutantes S21" e "Vénus em Chamas", dos Pop Dell'arte, "Sex Symbol" (1995); os discos dos Tédio Boys...
Até "Por Este Rio Acima", de Fausto, considerado um dos discos "incontornáveis" da música portuguesa, não se encontra por aí aos pontapés.
O cenário já esteve mais negro e constituem como factos positivos as recentes edições em CD dos álbuns dos Mler Ife Dada ou dos Santa Maria, Gasolina Em Teu Ventre.
Não há bela sem senão, como provou a reedição do primeiro disco dos Censurados, uma das bandas mais execráveis de sempre. Infelizmente, não caíram no esquecimento, como mereciam.
O mesmo não se pode falar dos míticos e fabulosos Vox Mambo, cujos dois álbuns aguardam ainda a reedição. Triste país este...
Chegou-se a falar da edição em DVD do seu lendário concerto na Festa do Avante mas, para já, não há novidades.
No meio disto tudo, as Editoras Discográficas aproveitam para fazer o seu choradinho para a imprensa, dizendo mal dos mauzões da pirataria, com o patrocínio de meia dúzia de badamecos de bandas de 5ª categoria. Antes de dizerem mal, façam antes o vosso trabalho de casa, ok?
Por ora me despeço, pois ainda tenho de fazer umas críticas literárias para o Mil-folhas.

segunda-feira, junho 26, 2006

Les petits lapins suicides ou "Conjugação dos artigos 134º e 135º do Código Penal"

A voz do povo ou "o cantinho da democracia"

Coelhinhos Suicidas

sábado, junho 24, 2006

Jenseits von Gut und Böse



quinta-feira, junho 22, 2006

E você?

Curriculum Vitae

Como o vencimento de um escritor falecido há mais de 60 anos não é muito substancial, tive de procurar uns empregos na secção de classificados do jornal. Lá encontrei um que me convinha, mas que continha um aviso ameaçador: "é necessário possuir conhecimentos de informática na óptica do utilizador". Fiquei sem saber o que isso era, mas o meu instinto disse-me que estava, de alguma forma, relacionado com computadores.
Lá consegui ligar a temível máquina, depois de várias tentativas falhadas.
Acedi a um programa chamado "Word", onde comecei a escrever o Curriculum Vitae.
Alguns amigos prepararam-me um texto para mandar: "experiência em Software ESRI, nomeadamente, ArcGis. Informática na óptica do utilizador, nomeadamente, Access, Project e Frontpage..."
Estava tudo muito bonito e eu já "dominava a situação" quando, num instante trágico e que para sempre lamentarei, o teclado deixou de dar sinais de vida. Tentei escrever algumas coisas, mas sem resultado. Desesperado, comecei a dar-lhe murros vigorosos. Talvez por isso, surgiram vários silvos agudos, vindos das entranhas da máquina.
Tentei reconfortá-la, mas sem efeitos práticos. Farto de ouvir esse ruído, mandei vários pontapés no computador e outros tantos murros no visor. Daí a pouco, apareceram, vindas do nada, várias faíscas, e até um pouco de fumo. Cheirava a queimado. As faíscas aumentaram de intensidade. Para tentar apaziguar a raiva do computador, deitei-lhe água, mas deu-se um fenómeno chamado "curto-circuito". Surgiram chamas, que irromperam um pouco por toda a sala. As pessoas saíram para a rua, em pânico. Os bombeiros foram chamados e já oiço, lá ao fundo, as sirenes. O prédio foi evacuado. Só cá estou eu, rodeado por chamas, mais esta máquina infernal, que não se cala por um instante que seja.
Tento encontrar uma tomada, para a poder desligar, ou talvez algum comando, no programa "Word", que diga "apagar incêndios".
Nem me passa pela cabeça fugir. Seria algo humilhante e indigno para uma pessoa com experiência em Software ESRI, nomeadamente, ArcGis.

quarta-feira, junho 21, 2006

Popularidade

domingo, junho 18, 2006

Mais um postalinho



















(Paul Delvaux, Vénus endormie, 1944)

sexta-feira, junho 16, 2006

Gino-falo-centrismo ou O feminismo freudiano

sexta-feira, junho 09, 2006

Jean-Paul Sartre, ou "O Futebolismo é um Humanismo"

Chega agora a vez de falarmos de Jean Paul Sartre, o famoso defesa esquerdo da equipa do Século XX. O seu aspecto físico impõe uma grande dose de respeito. Ao pé dele, o defesa benfiquista Luisão ganharia um concurso de beleza. É igualmente dotado de uma muito particular visão do jogo, a que os detractores maldosos apelidam de "estrabismo". Sartre é o que poderemos apelidar de "jogador individualista". Para ele, cada jogador deve escolher o seu próprio caminho sem o auxílio de padrões universais. Cada encontro contém uma série de escolhas, raramente sem nenhuma consequência negativa. E convenhamos, muitas vezes vêmo-lo fazer jogadas absurdas, levando-as sempre até ao fim, com resultados desastrosos. Como jogador, recusa-se a estudar o adversário antes dos encontros, pois, para ele, o conhecimento sensível sobrepõe-se ao conhecimento intelectual. Os jogadores surgem primeiro no campo, só depois é que se definem. Eles não possuem qualquer natureza, visto não haver Deus para as conceber. "O jogador não é mais do que aquilo que ele faz", é um chavão que costuma repetir à imprensa, além de "são 11 contra 11" ou "prognósticos só no fim", estes bastante utilizados pelos futebolistas portugueses da velha guarda, que foram por ele bastante influenciados. Por outro lado, é o primeiro a assumir as suas responsabilidades e erros. Nunca atira as culpas para cima do árbitro ou para o cortador da relva, a menos que esteja muito irritado. Os jogadores estão sós no mundo. Estão livres, sós e sem desculpas. Muitas vezes, ao intervalo, é visto a recolher às cabines cabisbaixo, com náuseas. Mas não pensem que é por causa da espetada de lulas que comeu ao almoço: é apenas porque reconheceu a gratuitidade das vicissitudes do encontro. Nestas alturas, tem a impressão de existir à maneira de uma coisa, de um objecto. Tudo lhe surge como pura contingência, sem sentido. No meio de tanto individualismo reconhecemos, com surpresa, que este lateral esquerdo se dá bem com treinadores exigentes, de pulso forte. Sartre vê neles a promessa da liberdade individual para exercer a arte do futebol como melhor entender. Os jogadores seriam libertados de decisões básicas para concentrar-se apenas no seu jogo. Isso aumentaria a concentração e os índices de confiança. Talvez por isto é que, apesar de achar unicamente que os jogadores se definem só no campo, acata de bom grado a sua posição de lateral esquerdo, por vezes a atacar mais, mas sem se aventurar por outros terrenos de jogo mais ao centro. Nos seus tempos áureos foi muito aplaudido, tendo mesmo recebido a Bola de Ouro numa ocasião. Sem se saber muito bem porquê, recusou o prémio.

terça-feira, junho 06, 2006

O Dia da Besta


Satanistas de todo o mundo, alegrai-vos, que este é o vosso dia. Pois é, para quem se interessa por isto, estamos a dia 6, do mês 6, do ano 2006, o que dá 666 (mais ou menos).
Por isso, hoje é um dia dedicado à Besta. Assim mesmo, com B grande.
Para comemorar a ocasião, estreia-se, a nível mundial, o remake de "The Omen", o filme de 1976 sobre o filho do Diabo. É fraquito, claro, mas um bocadinho de nada melhor do que estava à espera.
Calculo que haja fartas comemorações durante o dia, um pouco por todo o mundo.
Cá em Portugal, os interessados devem começar a dirigir-se o mais rápido possível à Serra de Sintra, pois há por lá um vasto programa de festividades, que incluirá muitas leituras de poemas dedicados ao nosso amigo, mais uns rituais de magia negra.
Conheço o caso de um satânico vegetariano que vai sacrificar uma melancia (sim, é verdade, a sério).

sábado, junho 03, 2006

Walter Benjamin, o “anjo” recolector

Declaro desde já que me proponho ao bombom oferecido pelo Algazel. Mas antes de mais há que tratar da colecção de cromos futebolísticos – é que a redondinha está prestes a rolar. E nada melhor do que lançar precisamente o cromo do Benjamin, guarda-redes da equipa do século XX.

A aptidão de Benjamin para as tarefas defensivas surgiu com uma admiração muito particular pela eficácia da dupla de centrais Marx-Engels, o que terá contribuído também para o seu fascínio pelo estilo de jogo da equipa do século XIX – Benjamin redigiu, de resto, algumas notas sobre aquilo que designou como a “tragédia barroca” dos seus agora adversários, regidos pela coragem e o desejo de vitória, elementos essencialmente anímicos e transcendentes à dinâmica do jogo. Contudo, rapidamente forjou um estilo próprio que o levou à titularidade entre os postes de uma equipa que joga de forma muito mais analítica. Benjamin será sempre um dos resistentes entusiastas do futebol total das velhas escolas, tal como o testemunham as suas críticas à “reprodutibilidade técnica” dos lances estudados e à sua indefectível defesa da “aura” dos grandes talentos, que lhe permite postular a crença num messianismo da ética de jogo independente de todo o mercantilismo esteticista que envolve o espectáculo. O seu estilo pessoal consiste na recolecção atenta dos remates adversários, que estuda com afincada paciência: «A suave monotonia ainda não envolve a minha baliza, gosto de marchar entre as suas fileiras de lances desordenados», afirma então em tom quase místico, referindo-se a si mesmo como um verdadeiro coleccionador de remates descontextualizados. Curioso é também o seu encantamento pelas particularidades arquitectónicas de alguns estádios, principalmente pelas arcadas do estádio parisiense de Saint Dennis, assim como a sua quase obsessão pelas figurações de anjos, nas quais projecta a própria imagem, concebendo-se como um guardião alado que protege as redes com a uma aura singular.