terça-feira, julho 28, 2009

A Escolha do Ângulo- Vídeos Veraneantes- nº1- Kevin Ayers e os seus Bailarinos Exóticos

Como tem sido hábito nos anos anteriores, o Ângulo vem dar a sua modesta contribuição para a galeria de videoclips veraneantes. Desta feita, e para abrir a época de praia, fica o videoclip de "Caribbean Moon", de Kevin Ayers, lançado em 1973. É de salientar a brilhante performance dos bailarinos exóticos, e o bonito fato de marujo de Kevin Ayers. Ideal para se ouvir a caminho da Praia do Meco.


quinta-feira, julho 09, 2009

Sonho de menino

Parece que de uma assentada dois sonhos de menino foram concretizados quase ao mesmo tempo: o Real Madrid concretizou o sonho de menino de contratar Cristiano Ronaldo para as suas fileiras; já Deus concretizou também o seu sonho de menino, levar Michael Jackson definitivamente para os seus domínios. Parabéns a ambos.

sábado, julho 04, 2009

As Camisolas Dos Meus Colegas

Quando saiu a Ana Rita, em inícios de Fevereiro, houve uma semana, ou duas, de incerteza expectante. A Ana Rita trabalhava na Empresa há dois anos e meio, chegou a ser uma funcionária bastante promissora, e recebeu uma menção honrosa no Anuário Societário, logo no ano em que entrou. Todavia, nos últimos meses, o seu trabalho entrou em declínio. Teve uma separação traumática, e pareceu perder motivação quando não foi promovida a um lugar de chefia no seu Sector, quando o António Macedo saiu, ao ter sido convidado para um lugar de Director Adjunto numa Sociedade concorrente.

Por isso, foi sem grandes surpresas que soubemos, depois de ela ter ido duas semanas de férias para umas ilhas no Pacífico, que não iria voltar, ao ter acertado a sua rescisão amigável com os Altos Quadros da Empresa.

O nosso chefe apenas nos comunicou que a Ana Rita não voltaria, e que entraria outra pessoa para o seu lugar, depois de serem feitas as necessárias entrevistas, para descobrir o perfil certo e a pessoa mais qualificada a ocupar o lugar deixado vago por si.

Surgiram rumores acerca de uma contratação milionária a uma alta personalidade de uma Empresa rival, mas estes revelaram-se carecidos de fundamento, passado poucas horas.
As entrevistas estavam rodeadas de secretismo, e nunca vimos nenhum dos candidatos. Faziam-se apostas sobre o sexo, ou a idade do novo membro da nossa equipa.
As mulheres prefeririam um homem, pois cerca de 65 por cento dos funcionários eram do sexo feminino.

Foi, por isso, com alguma alegria que foi anunciado o novo Colega, numa tarde de finais de Fevereiro. Tratava-se de um indivíduo chamado Trajano Fonseca e Cunha, e o nosso Director Geral fez questão de dizer que se tratava de um incansável trabalhador, com um Currículo invejável, e que vestiria a camisola da Sociedade com grande seriedade, profissionalismo, e espírito de equipa, de luta e de sacrifício. O Director Geral comunicou que o novo funcionário começaria a trabalhar na Segunda-Feira seguinte, e que ficaria no lugar anteriormente ocupado pela Ana Rita.

Nessa Segunda Feira, chegámos quase todos um pouco mais cedo, talvez curiosos com a vinda do nosso novo colega.
Por volta das nove da manhã, apareceu o Director Geral, acompanhado de todos os outros Directores, e anunciou que nos ia apresentar a nova contratação da Empresa.
Estávamos todos sentados nos nossos lugares, no Open Space, quando surgiu o anúncio:
“Caros Funcionários, o Currículo do vosso novo colega é irrepreensível, e ele vem com grande vontade de dinamizar esta Sociedade. Espero que o ajudem na sua tarefa, tal como ele vos ajudará, certamente, e que possam vestir convenientemente a camisola da Empresa, sem que esta vos esteja muito larga. Sem mais delongas, apresento-vos o Trajano Fonseca e Cunha”!

Começámos a olhar para todos os lados, em busca de uma cara nova. Mas não apareceu ninguém. Achámos que estava escondido, dentro de algum armário, e que saltaria ao ouvir a palavra de ordem, mas tal não aconteceu. De resto, essa conduta não se coadunaria com a postura dos Directores, que eram um pouco austeros e conservadores.

Olhámos, de novo, surpreendidos, para o nosso Director-Geral, quando reparámos que ele apontava o dedo para um local específico- a secretária anteriormente ocupada pela Ana Rita. Seguimos a direcção do seu dedo, e vimos uma cadeira e uma mesa vazias, mas com o candeeiro ligado, e vários processos em cima da mesa.

O Director-Geral prosseguiu: “bem, agora que já fizemos as apresentações, espero que elucidem o vosso novo colega sobre as suas funções. Como vêem, ele já tem alguns processos em mãos. O seu email é
trajano-fonseca@gmail.com. Auxiliem-no, no que for necessário, para que ele se ambiente, e faça bem o seu trabalho, mandem-lhe coisas para o mail, caso seja necessário. Porque, já sabem: o bem-estar de cada um de vós equivale ao bem-estar da Sociedade. Até logo”.

Com estas palavras, todos os Directores se afastaram em direcção ao seu gabinete. Quanto, a nós, os restantes Funcionários, os chamados “Subalternos” na hierarquia da Empresa, mantivemo-nos calados, a olhar para a mesa do dito Trajano. Pensámos, ao princípio, que se tratava de alguma piada, e que o novo Funcionário chegaria daí a pouco. Mas tal não aconteceu, durante o resto de toda a manhã. Até nos esquecemos da habitual pausa para o café, que ocorria, religiosamente, às 10.30 da manhã, e na qual aproveitávamos para nos deslocar à Copa, para nos descontrair um pouco, estar na galhofa, e fumar um cigarro.

Embrenhámo-nos no trabalho, durante várias horas, e só tirámos os olhos dos computadores, para olhar, de vez em quando, para a mesa do Trajano, que se mantinha inalterável.
Saímos para o almoço, a Luísa olhou, directamente para o local onde estaria o Trajano, e perguntou, com uma voz pouco convincente: “queres almoçar connosco?”

Ao não obter resposta, reparei que sentiu um pequeno alívio, e seguimos todos para o restaurante. Mas não falámos da grande questão, e comentámos apenas trivialidades, os nossos pequenos fait-divers, e dramas domésticos, ou a situação política no país. Nenhum de nós o disse, mas penso, agora, que já durante esse dia, sentíamos, talvez, por mais absurdo que isto possa parecer, que o Trajano poderia estar ao pé de nós, a ouvir a nossa conversa, e talvez a transmiti-la a todos os Directores, antes que regressássemos do almoço.

O almoço demorou menos tempo do que o costume, voltámos, rapidamente, para os postos de trabalho. Olhámos, obviamente, para a secretária em causa, em busca de novidades, mas continuava tudo na mesma. A cadeira e a mesa, vazias, o candeeiro ligado, e o monte de processos, tal como tinha sido deixado horas antes.

Tomámos, rapidamente, uma decisão. Eu fiquei com o processo Antunes Fernandes, cujo prazo terminava passados poucos dias. O Martins ficou com mais outro processo, a Marta com um terceiro processo, e os outros foram divididos pelos restantes funcionários, já não me lembro bem por quais. Tínhamos de ajudar o Trajano, na sua integração, para o bem da Empresa, que era, afinal, o bem de cada um de nós.

Eu encarreguei-me de lhe mandar um mail, onde falava de todos os procedimentos que achava mais necessários à sua função. Essa tarefa ocupou-me algumas horas, e deixei algum trabalho atrasado. Como tal, só pude sair às dez da noite. Quando saí, o candeeiro do Trajano mantinha-se ligado, desejei-lhe boa noite, e vim-me embora para casa.

No dia seguinte, quando apareci, bastante cedo, por volta das 8 da manhã (ainda deixara alguns processos em atraso), reparei que o candeeiro do Trajano já estava aceso, e em cima da mesa se encontrava mais um monte de processos. Olhei para os meus colegas (que já lá estavam, sentados, com um ar cansado, e angustiado), e reparei que cada um deles tinha em cima da mesa um enorme monte de dossiers.

A Catarina disse-me: “olha, não queres pegar em alguns desses processos do Trajano?”. Hoje tenho de acabar estes 10 dossiers, não posso fazer mais nada.
Acedi, agarrei em 5 dossiers, e comecei, imediatamente, a trabalhar. Passaram as 10.30, e ninguém se levantou para a pausa do café. Olhei para o Bernardo, a Marisa e a Sofia, e vi-os a tragar, vorazmente, enormes quantidades de café, que tinham trazido de casa, dentro de umas canecas. Outros, como o Ricardo, tomaram outro tipo de bebidas energéticas.

Eu não disse nada, continuei a trabalhar. Estávamos todos absortos no que fazíamos, sem tirar os olhos do papel, ou do computador, só nos levantávamos para imprimir alguma coisa, ou para mandar algum recado importante. De vez em quando, alguém suspirava, mas olhava, sobressaltado, para a mesa do Trajano, e disfarçava o seu gesto.

Fui a única pessoa que saiu para almoçar, nesse dia. Já não aguentava aquele ambiente, apetecia-me espairecer um pouco, e dirigi-me a um desses muitos restaurantes que há na zona, comi, de pé, ao balcão, e olhei para toda aquela gente indistinta, a devorar a sua refeição o mais rápido possível, e também comi, bastante depressa, um qualquer prato do dia, daquelas febras de porco, feitas em linha de montagem, para serem preparadas e devoradas em cinco minutos, engoli tudo, sem apetite, e depois, olhei para o meu lado, onde estava um lugar vazio, e recordei-me, não sei porquê, do Trajano, e passou-me a pouca fome que tinha, pedi o café, que bebi de um trago, dei uma nota, e nem esperei pelo troco, voltei, a correr, para o Escritório.

Quando cheguei, estava tudo na mesma, apenas um monte maior de processos e papéis em cima da mesa do Trajano.
A Catarina ia dirigir-me a palavra, antecipei-me: “sim, eu sei, fico com mais alguns processos, não há problema”.

Saí às 23.30, ainda havia alguns colegas a trabalhar, desejei as boas noites a todos, e voltei para casa, quase a dormir.
Os meus problemas familiares começaram nesse dia, com a normal invocação da “falta de tempo” para a família, e para as crianças, que estavam em idade escolar, e que precisavam do acompanhamento dos pais. É certo que os deixamos em Centros de Explicação, depois de terminarem a Escola, depois têm aulas de equitação, piano, tudo o que seja possível para os manter ocupados.

De manhã, esperava-me o cenário habitual, os montes de processos em cima da mesa do Trajano. Não foi necessário pedir explicações. Peguei num monte, e pus-me a trabalhar. A partir desse dia, não mais voltei a ouvir as vozes dos meus colegas, excepto para assuntos urgentes de trabalho. Quando chegamos, desligamos os telemóveis pessoais, para não nos distrairmos, e porque reparámos que não nos sentimos à vontade para atender o telefone, ao pé do Trajano.

Passei a trazer, de casa, uma marmita, com o café, bebidas energéticas, e o almoço. Só me levanto para ir à casa de banho.
E estou quase a chegar ao fim do meu relato. Posso apenas dizer que me divorciei, entretanto, e o trabalho aumentou. Apesar disso, quase não consigo dar conta do recado.

Por isso, Trajano, desculpe mandar-lhe este mail, a contar-lhe isto tudo, mas queria que soubesse que não tenho nada contra si. Desejo-lhe tudo de bom, e espero que a camisola da Empresa lhe esteja a assentar bem. Eu, arrisco-me a dizer já está um pouco grande, para o tamanho do meu corpo. Mas chega de lamúrias. A Catarina despediu-se, e dizem que já arranjaram um substituto, que será apresentado amanhã. Estou curioso, acho que vou aparecer mais cedo, quero conhecer a nova contratação, que dinamizará, e trará, sem sombra de dúvidas, muitas mais-valias para a Sociedade.