segunda-feira, dezembro 21, 2009

Não Leia Na Diagonal! Assine Esta Petição, e Faça, Neste Natal, Uma Boa Acção

O meu envolvimento nas lutas pelos Direitos dos Seres Vivos mais Desprotegidos iniciou-se quando eu já tinha uma idade relativamente avançada. Durante o Liceu, cheguei a ridicularizar algumas tomadas de atitude de certos colegas meus, que eram identificados como sendo de esquerda. No Colégio onde estudei, o único slogan usado pelos meus amigos (e por mim), que se pudesse assemelhar, minimamente, a uma preocupação cívica era o famoso “Destrói as Ondas, não as praias”, que eu ostentava, orgulhosamente, nas tshirts, por alturas de Verão (se bem que a minha única experiência no combate às ondas se tenha cingido a meia dúzia de tentativas falhadas para me manter à tona de água, em cima de pranchas de Bodyboard compradas no supermercado, por meia dúzia de tostões). Agora que penso no assunto, recordo-me de outra frase, que tinha estampada, noutra tshirt, e que rezava, mais ou menos, o seguinte: “Sempre que dás um peidinho, morre um golfinho”.

Seja como for, comecei, a interessar-me, vagamente, pelos Direitos dos Animais, apenas na Faculdade. E isto deveu-se a motivos que consideraria tudo menos altruístas. Uma tarde, encontrei uma bela miúda a distribuir panfletos. Cheio de curiosidade, aproximei-me, e tentei entabular conversa:

- Então, estudas por aqui? Estás a distribuir panfletos sobre a Festa do Baptismo do Vómito ao Caloiro?

A rapariga dirigiu-me um olhar gélido, e cheio de desprezo, que me fez estremecer, e que nunca esquecerei. Sem me responder, deu-me um panfleto, para a mão. O panfleto mostrava um touro, a esvair-se em sangue, e com uma legenda, que dizia o seguinte:

- Homem, homem, porque me persegues? (numa inteligente alusão ao momento da conversão de São Paulo de Tarso, no seu caminho para Damasco).

Foi como se um resplendor de luz tivesse caído do Céu, e me tivesse iluminado, naquele glorioso instante. A partir daquele dia, tornei-me, durante dois anos, um fervoroso opositor das touradas, garraiadas, largadas, e tudo o que estivesse levemente relacionado com a humilhação dos Touros. Esses anos coincidiram com o meu namoro com a activista dos direitos dos animais, acima mencionada.

Fiz parte das “Jornadas Ibéricas contra os touros de morte”, do Movimento “Transformem as Praças de Touros em museus contra o holocausto taurino”, do Movimento Politico “Fuzilamento imediato de todos os Toureiros” e autor do famoso slogan “O Bom forcado está enforcado”.

Mas tudo o que é bom acaba. Zanguei-me com a minha namorada, e abandonei a causa taurina. Entretive-me a acabar o Curso, a arranjar um emprego num Escritório, onde fiquei durante uns anos.

A minha promissora carreira na Luta pelos Direitos dos Seres Vivos mais Desprotegidos poderia ter ficado por aqui, caso não tivesse recebido um email, que se revelou providencial.

No email, pediam para assinar uma petição, para salvar o Robert. Tratava-se de um gato siamês, com 5 anos de idade, e que era usado como cobaia, para todo o tipo de experiências, na Universidade de Utah.

Comovi-me, ao ver as fotos do bicho. E resolvi assinar a petição.
Posso dizer, com orgulho, que a minha assinatura (juntamente com outras 15 mil) contribuiu para libertar o Robert das garras dos seus temíveis captores.

Entusiasmado, juntei-me a várias Associações de Defesa dos Animais, que me inundavam a caixa de correio com novos (e urgentes) pedidos.
Fazem parte do meu currículo (entre muitas outras), as assinaturas de petições para libertar os seguintes animais:

. A Chimpanzé Wanda (usada em experiências da NASA), em Novembro de 2008…
. O elefante Tommy (usado em diversos, e repugnantes truques de circo), em Fevereiro de 2008…
. O golfinho Malaquias (utilizado num Zoomarine, no Estado de Rio Grande do Sul, no Brasil), em Julho de 2007…
. A família de focas McCormack (um conjunto de 20 focas, que estava prestes a ser chacinada nas Ilhas Faroe), em Abril de 2006…
. A defesa de fungos e pequenos microorganismos (que estavam em vias de ser exterminados, na construção de um resort de luxo, nas Seychelles), em Outubro de 2005…

E tantos outros acontecimentos….

Abandonei o emprego no Escritório, tornei-me vegetariano, e passei a fazer parte da Direcção de uma famosa Associação de Defesa dos Animais. Participei em centenas de Colóquios, e Acções de Formação. Os meus trabalhos teóricos estão editados em várias línguas, e assinava colunas de opinião em, pelo menos, cinco blogs.

Mas, cá dentro de mim, e da minha consciência, continuava a haver inquietação, inquietação. Era só inquietação. Porquê? Não sabia, não sabia ainda. Mas havia qualquer coisa que estava para acontecer, qualquer coisa que eu devia perceber. Qualquer coisa que eu tinha de fazer, que devia resolver. Porquê? Não sabia. Mas sabia que essa coisa é que era linda.

A expressão Serendipidade advém da palavra inglesa Serendipity, e foi criada pelo escritor inglês Horace Walpole, no Século XVIII.
Segundo o meu entendimento, trata-se de um neologismo, que se refere às descobertas afortunadas feitas, aparentemente, por acaso.

Devo a uma refeição vegetariana, ocorrida num restaurante (lá para os lados do Príncipe Real) a descoberta da minha nova vocação. Não sei se a expressão serendipidade se aplicará, verdadeiramente, ao meu caso. Mas, se eu não me tivesse tornado vegetariano; se não sentisse um profundo envolvimento na luta de todos os seres vivos desprotegidos; e se não tivesse feito a fatal pergunta ao meu amigo Manuel…nada disto teria ocorrido.

Foi durante o jantar. O Manuel devorava, imensamente, satisfeito, uma pratada de tofu, quando resolvi colocar-lhe A questão:
- Manuel, de que é feito o tofu?
Com a boca cheia, respondeu-me:
- O tofu é um alimento produzido a partir da soja.

Insatisfeito com a resposta, perguntei-lhe:
- Manuel, o que é a soja?
Com a boca cheia, respondeu-me:
- A soja é um grão rico em proteínas, cultivado como alimento, tanto para humanos, como para animais. Pertence à família Fabaceae (leguminosa), assim como o feijão, a lentilha, e a ervilha.

Insatisfeito com a resposta, perguntei-lhe:
- Manuel, o que é o grão?
Com a boca cheia, respondeu-me:
- O grão é um tipo de fruto, com uma semente presa ao pericarpo, em toda a sua extensão.

Insatisfeito com a resposta, perguntei-lhe:
- Manuel, o que é um fruto?
Com a boca cheia, respondeu-me:
- Em termos botânicos, o fruto é uma estrutura presente em todas as angiospermas. Deriva do ovário das flores.

Insatisfeito com a resposta, perguntei-lhe:
- Manuel, o que são flores?
Com a boca cheia, respondeu-me:
- A flor é a parte das plantas onde se encontram os seus órgãos sexuais.

Insatisfeito com a resposta, perguntei-lhe:
- Manuel, o que são as plantas?
Com a boca cheia, respondeu-me:
- Ora, como todos sabem, o Reino Plantae, Metaphyta, ou Vegetabilia, é um dos principais grupos em que se divide a vida na Terra…

Entusiasmado com a descoberta, gritei:
- Então, se a planta é um Ser Vivo, estamos, neste momento, a devorar Seres Vivos!
Com a boca cheia, o Manuel respondeu-me:
- Ora, obviamente! Pensavas que estávamos a comer calhaus?

Indiferente à indiferença do Manuel, cuspi, de imediato, toda a comida que me restava na boca, e pousei os talheres sobre aquele prato de cadáveres plantícios.

Naquela noite, abandonei a Direcção da Associação de Defesa de Animais, e passei a dedicar-me, com afinco, à Associação de Defesa de Plantas, que criei, entretanto, e da qual sou o Presidente.

Apesar de a nossa actividade ter começado muito recentemente, já fizemos algumas acções dignas de relevo, das quais destaco:
- O bombardeamento, com Cocktails Molotov, de um restaurante vegetariano, sito perto da Avenida da República, em Novembro de 2009.
- O rapto de um famoso cozinheiro de pratos vegetarianos, em Outubro de 2009.
- O Protesto em frente à Assembleia da República, com cartazes alusivos ao tema, e com direito a uma nota de rodapé na Dica da Semana, na sua Edição de 25 de Setembro de 2009.

Caro amigo, graças a sua assinatura nesta Petição, conseguimos libertar dois quilogramas de seitan, e cinco quilogramas de tofu, que poderão, desta forma, passar um Natal em Segurança.
Mas a luta está apenas no início!

Quanto à pergunta que me fazem com mais frequência: “Como é que se alimenta, caraças?”, posso, somente, responder, que estou a desenvolver um método próprio de Fotossíntese, que me permitirá, no futuro, acumular energia a partir da luz, para uso no meu metabolismo.

Até conseguir processar a Fotossíntese no meu corpo (tarefa que deverá durar algum tempo a ser aperfeiçoada), limito-me a comer bolachas de água e sal. Como é do conhecimento público, o sal é um composto iónico, e a água é uma substância química. Por isso, não há problema.

Obrigado, de novo, pelo seu interesse. O seu envolvimento é realmente importante.

Com os melhores cumprimentos, subscrevo-me, com amizade

O Presidente da AMDTS- Associação Mundial de Defesa do Tofu e do Seitan

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segunda-feira, dezembro 07, 2009

Últimas recomendações

O andar debaixo do meu, está vago. No andar de cima, mora o Serial Killer. Não o conheço bem, mas sei que se mudou para aqui cerca de dois anos depois de mim. Ambos temos um feitio reservado. Eu, pouco sei da vida dos restantes habitantes da rua, e suspeito que o meu vizinho, até devido à sua ocupação, incorra pelo mesmo caminho.

Tenho a vaga ideia de que trabalha para um qualquer, e obscuro, Departamento do Estado. Para mim, nem é novidade, sou filho de Funcionários Públicos.
Não nos falamos, aparte os formais, e ocasionais cumprimentos de ocasião, quando nos cruzamos nas escadas. Apesar disso, considero que temos uma boa relação.

O meu vizinho é muito calado. Nunca mete música (pelo menos, que se oiça), não ouve televisão, e não fala alto, nem ao telefone, nem com qualquer visita que receba. Suspeito que a primeira coisa que faça, quando chega a casa, seja tirar os sapatos, e calçar umas pantufas. Os seus passos são suaves, indistintos. O quarto do meu vizinho é mesmo em cima do meu, e o nosso prédio, muito antigo, e com soalho em madeira, é bastante propício à ocorrência da propagação do som.

Todavia, e mesmo quando está a cometer um homicídio, o meu vizinho nunca deixa de ser bastante cuidadoso. Nunca ouvi ninguém gritar, quando muito, distingo um suave murmúrio, ou gemido, quando estou deitado, na cama, sem conseguir dormir. Isto é espantoso, e louvável, pois suspeito que o meu vizinho cometa os seus homicídios no quarto, para onde atrai as vítimas, já bastante bebidas, depois de uma noite intensa de copos. Penso que as matará sem derramamento de sangue (talvez por asfixia?). Digo isto, porque o soalho contém algumas frinchas, e seria bem possível que alguma gota caísse para o meu quarto.
Contudo, posso estar apenas com conjecturas. Se calhar, ele até coloca, previamente, um lençol no chão, para que o sangue da vítima fique localizado, e não se propague.


Os meus amigos gostam particularmente do vizinho de cima. Há, todos os fins-de-semana, enormes jantaradas, em minha casa, para as quais não convido nunca menos de trinta pessoas. Bebemos bem, e fazemos o máximo de barulho possível. Às vezes, organizamos um jantar temático, a que damos o nome de “Jantar – Mistério”: a cada pessoa é dado um papel, com o personagem que tem de desempenhar, e indicações, a que tem de obedecer. Existe um homicídio, e algum dos presentes é o culpado. Os outros, terão de adivinhar o móbil do crime, a arma, e, claro, o autor do crime. Quando adivinhamos quem matou quem, abrimos garrafas de vinho, e bebemos, efusivamente.
Há sempre vários DJ Sets, e nunca acabamos as nossas festas antes das 6 da manhã. Escusado será dizer que o meu vizinho nunca se queixa do barulho. Desconfio que até lhe agradem estas festas (sempre está mais à vontade, nas suas próprias actividades). Se eu não soubesse que ele tem um feitio reservado, até o convidaria, uma noite, para jantar cá em casa.

Deve aturar muito barulho, que lhe será, obviamente, incómodo. Durante a semana, gosto de praticar no Trompete, e sinto-me mais inspirado a tocar por volta das duas da manhã. Ora, sabendo (como sei) que o meu vizinho sai de casa, antes das oito da manhã, para trabalhar, apenas me posso sentir grato por nunca me ter dito nada (honra lhe seja feita).

O meu vizinho é prestável. Os funcionários da Câmara Municipal (numa excelente iniciativa, que aproveito para louvar, e aplaudir) distribuem, gratuitamente, todos os meses, e em todas as casas do bairro, sacos pretos, para deitar o lixo. Graças a isso, quando vou ao supermercado, nunca tenho de comprar sacos de plásticos. Do mesmo modo, em casa, tenho sempre dezenas de sacos de reserva, caso venha a precisar. Quando ficam cheios de lixo, abro a porta da rua, que dá para as escadas, e pouso os sacos no patamar de acesso à casa. Isto porque os contentores mais próximos ficam a uns bons 500 metros e, muitas vezes, não tenho paciência para sair à rua.

E o que faz o meu vizinho? Todas as manhãs, e sem eu lhe pedir, recolhe os meus sacos, e desembaraça-se deles. Porquê? Não sei bem. Talvez para misturar, e camuflar, os bocados dos corpos das vítimas, que desmembrará, previamente, em casa.
Uma vez, quando deitei fora um recipiente cheio de lulas à Sevilhana, que deixara azedar, por descuido, pensei, por instantes que, daí a umas horas, as lulas poderiam estar a fazer companhia, no mesmo saco, à cabeça de alguma pobre vítima. Pensamentos tolos, não? Eheh.

O meu vizinho é muito asseado. Às vezes, espreito pelo ralo da porta, e vejo-o a fazer limpezas, nas escadas. Ele lava a sua casa, constantemente e, pelas frinchas do soalho, entra-me sempre um suave odor, indefinível, mas agradável, que me recorda, nem sei bem porquê, a minha casa de infância.

Agora, e mudando um pouco de assunto: não sei se vais conhecer a minha mulher. Ontem à noite, estava a fazer o jantar. Já era um pouco tarde e, enquanto preparava uma salada, lembrei-me que não tínhamos vinagre balsâmico. Distraído, disse à minha mulher para ir bater à porta do vizinho, e perguntar-lhe se ele não teria um pouco de vinagre, que pudesse disponibilizar.

Já se passaram umas horas, e ela ainda não voltou. Entretanto, comi uma lata de atum, para enganar a fome, e desisti da salada. Podem estar apenas a conversar, um com o outro (ainda não te contei, mas o meu vizinho tem uma aparência agradável, é alto, com um corpo atlético). De qualquer forma, as minhas últimas duas namoradas, a quem eu mandara, igualmente, fazer um pedido ao vizinho, nunca voltaram.O Paul Simon tem uma música em que diz: "There must be 50 ways to leave your lover". Eu só conheço uma. Mandá-las pedir vinagre balsâmico.

Seja como for, enquanto comia, às garfadas, o atum de lata, deu-me aquele spleen, que costumo sentir nos domingos à noite, especialmente durante os meses de Inverno, e pus-me a tocar no Trompete uma música do disco Chet Baker Sings, “There will never be another you”. Fiquei melhor, e ainda fiz algumas partidas de poker, na net. Agora, vou-me deitar, tenho de me levantar cedo, amanhã.

Chegas às 18 horas, não é? A cidade tem duas estações de comboio, sais na PRIMEIRA. Depois, ou apanhas um táxi, ou vais de metro, pois há uma estação mesmo ao lado. Segues pela linha VERDE, e sais na QUINTA estação. A minha rua fica mesmo junto à saída.
Não tens de agradecer, é um prazer acolher-te em minha casa durante alguns dias. Amanhã, contas-me melhor o que tens feito nestes últimos meses. Se tiveres alguma dúvida, liga-me para o telemóvel.
Ah, o número do meu Prédio é o 120.

Quando chegares, toca à porta. Não te esqueças, é o segundo andar. O andar debaixo do meu está vago. No andar de cima, mora o Serial Killer.

sexta-feira, dezembro 04, 2009

O Movimento Artístico dos 39 Graus - 2ª Parte

Foi em inícios de Dezembro. Mascarenhas estava constipado, e com muita febre (39 graus, como explicou, mais tarde). O corpo tremia-lhe, e não parava de espirrar, e tossir.
Apesar de tudo, não quis deixar de passar pela Tasca. Sentou-se à mesa do costume. Os amigos olharam-no com simpatia, e uma certa preocupação, e perguntaram-lhe se já tinha tomado medicamentos para a constipação. Depois, retomou-se a conversa.
Luís reparou que uma das suas colegas de mesa estava a utilizar um caderno, e uma caneta (na Tasca, são dois objectos muito comuns – todos escrevem poesia, ou algum Manifesto Artístico, ou pintam, ou desenham…)
Pediu à amiga que lhe emprestasse a caneta, e o papel e, “num rasgo de criatividade febril” (a chalaça não é minha, vem na autobiografia de Mascarenhas), escreveu a piada que o tornou célebre, e que viria a definir todo o Movimento Artístico “Os 39 Degraus”. Eis uma reprodução da imagem, como vem na Antologia Cómica de Luís Mascarenhas:


Pergunta: O que é isto?



















Resposta (ou punchline) : é um Triângulo Amoroso

A piada foi esta. Contém, pelo menos, dois indícios que nos levam a prenunciar o humor do Movimento 39 Graus. A saber: a conjugação entre várias manifestações artísticas (neste caso, a escrita e o desenho, se bem que ainda numa fase bastante rudimentar); a própria criação da anedota (sob o efeito de uma febre de 39 graus).

Não se sabe se por comiseração pelo estado de saúde de Mascarenhas, pelo estado de embriaguez geral, ou por simples entusiasmo genuíno, mas a verdade é que toda a irmandade da Tasca se riu, em uníssono, num momento de euforia, que foi, por acaso, captado pelo futuro fotógrafo do Movimento 39 Graus (poderão consultar a imagem na fotobiografia “Humor Sempre a Aquecer - os 10 anos do Movimento 39 Graus”).

Durante o resto da noite foram criados os Princípios Fundamentais do Movimento, que assentavam em alguns pilares, como estes dois:
. A conjugação entre vários tipos de Artes (que poderiam ir desde a pintura usando, estritamente, cinzas de cigarros; a criação de poemas com os rótulos de garrafas Super Bock; música experimental feita à base de uma jukebox estragada, ….) num único objecto final.
. Obrigatoriedade de criar e representar uma Obra de Arte apenas quando os Artistas nela intervenientes estivessem, pelo menos, com 39 graus de temperatura e/ou num forte estado de quase inimputabilidade.

Mascarenhas, o Papa do 39 grauísmo, é inflexível neste aspecto. Muitos dos artistas deste movimento tomam elevadas doses de álcool, para aumentar o grau de inconsciência relativa (posição contestada, mas tolerada, por Mascarenhas, que prefere utilizar a pureza do Estado Febril ao natural. Por outro lado, Mascarenhas fica desagradado com o modo caótico e violento com que acabam certos espectáculos do Movimento 39 Graus, por causa do consumo excessivo de álcool e substâncias ilícitas- vide Natal dos Hospitais 2006).

Muito se poderia dizer acerca deste Movimento, mas o tempo já vai longo e, como diria o seu Artigo nº8: “nunca escrevas obras que as pessoas leiam, apenas na diagonal”.

Na Edição do próximo mês, falaremos, mais aprofundadamente, do Princípios Basilares do Movimento 39 Graus. Falaremos, ainda, com o conceituado Jurista Dr. Jodi Gallo, sobre a imputabilidade (ou não) das acções de Luís Mascarenhas na sua Esfera Jurídica e, ainda, das bombásticas colaborações entre o Movimento 39 Graus e o Movimento do Rock Terrorista (encabeçado pelos míticos Steve McCormack; Rufus McGerrick e Duncan McMamoth, A.K.A., J.B.).


Para finalizar, mostramos uma imagem da primeira Obra Colectiva do Movimento 39 Graus, que pega nas obras de vários pintores Impressionistas do Século XIX, e mistura-as com filmes de culto do Século XX, como este de Woody Allen, que se vê na imagem.
A obra encontra-se, neste momento, exposta na Colecção Berardo.




















Como já devem ter adivinhado, trata-se do famosíssimo "Take the Monet and Run"

O Movimento Artístico dos 39 Graus - 1ª Parte

Alguém disse, uma vez, que aos doentes tudo se perdoa, e esse preceito aplica-se, na perfeição, a Luís Mascarenhas, o mentor, e fundador do Movimento Artistico “Os 39 Graus”, e um dos humoristas (e artistas) mais populares, conceituados, e (porque não?), polémicos, da sua geração.

Ao princípio (e isto, digo-o com sinceridade), ninguém lhe auguraria um futuro tão brilhante. Aluno apagado, na escola, macambúzio, sempre calado, sentado, na mesa mais longínqua da sala. Não abria a boca quando os colegas contavam uma anedota, nem ripostava quando gozavam com ele.

Duvido que algum colega de Liceu se lembrasse de si, caso não se tivesse dado o estranho caso de Luís Mascarenhas se tornar famoso. O mesmo se diria dos seus colegas da Universidade, para onde transitou a seguir. Era um Curso de Economia, Gestão (ou seria Engenharia?). De qualquer modo, não suspeitaríamos encontrar um Artista Cómico (nem sequer um Artista) naquele indivíduo de camisolas demasiado largas, calças demasiado curtas, cabelo demasiadamente demasiado extra – ordinário…

Fica desses tempos a alcunha que lhe davam, e que perdura até hoje: “Qual Luís?”. Isto deve-se ao facto de os professores perguntarem, pelo Luís Mascarenhas, nas aulas, pois este faltava mais vezes do que seria desejável. “Qual Luís?”, era a resposta, sincera e invariável, dos seus colegas.

(Dizem que a sua primeira namorada respondeu o mesmo, aos seus amigos, quando estes perguntaram por ele, uns meses depois de terminado o namoro, e quando já se estranhava a ausência do futuro humorista).

A vida de Luís mudou quando, ao terminar o Curso, foi trabalhar para um Escritório esconso, junto a uma Tasca, que mais parecia um Saloon, num antigo bairro da cidade.
Como não tinha nada que fazer por casa, Luís passou a frequentar, diariamente, a citada Tasca, e rapidamente se tornou familiar de todos os outros clientes, que eram, tal como ele, frequentadores assíduos da dita espelunca.

Trocavam impressões sobre todo o tipo de assuntos e, um dia, depois de uma conversa mais animada, e mostrando um índice de confiança elevado, Luís resolveu contar a sua primeira anedota. Os resultados foram desanimadores. Os seus interlocutores desviaram o olhar, envergonhados e constrangidos. Depois de uns segundos de silêncio, a conversa sobre futebol retomou, e todos fingiram que nada se passara.

A anedota foi reunida, mais tarde, no Volume de Raridades, Anedotas B, e Anedotas Iniciais de Luís Mascarenhas (entretanto esgotado), e reproduzimo-la, agora, com a autorização da Editora:

“O Abominável Homem das Neves (ou Yeti) andava triste, e solitário, nas suas cavernas dos Himalaias, e andava a precisar de sol, e miúdas. Por isso, comprou um bilhete de avião para o Algarve, e foi para um apartamento em Albufeira. Como era bastante peludo, e sabia algumas (poucas) frases em português, e em inglês, resolveu engatar uma bifa, fazendo-se passar por português.
Levou-a para o seu apartamento, e a bifa foi para a casa de banho, arranjar-se. Passados vários minutos, e uma vez que a bifa não saia da casa de banho, o Abominável Homem das Neves, arrombou a porta, com um estrondo. De rajada, perguntou à bifa:
- Are You ready?
Ao que a bifa respondeu, aterrorizada:
- Not, Yeti!!!”

Fim da citação. A anedota pretendia fazer um trocadilho entre as palavras Yet (not yet), e Yeti, mas perde-se em grandes explicações, para além de ter uma punchline demasiado fraca.

A carreira de Mascarenhas poderia ter-se ficado por aqui, não fosse um episódio casual, e decisivo, ocorrido numa fria tarde do mês de Dezembro.

(fim da primeira parte da reportagem)